Novo Nordisk: Preocupação inicial foi “garantir o abastecimento contínuo dos medicamentos” a doentes crónicos

Em entrevista ao Jornal Económico, a diretora-geral da Novo Nordisk Portugal, Anja Salehar, explicou a importância de investir nos ensaios clínicos, uma área que foi bastante afetada em Portugal durante a fase mais preocupante da pandemia e como a Covid-19 enfatizou a necessidade de prevenir e tratar doenças como a diabetes e a obesidade, uma vez que são doenças prévias que apresentam fatores de risco de complicações em caso de infeção pelo novo coronavírus.

Mais de metade dos portugueses sofrem de obesidade ou estão no patamar da pré-obesidade, de acordo com o Instituto Ricardo Jorge, enquanto a diabetes afeta mais de um milhão de portugueses. A empresa dinamarquesa Novo Nordisk assumiu como sua missão o abastecimento de medicamentos durante a pandemia, e tem os ensaios clínicos como área prioritária.

Em entrevista ao Jornal Económico, a diretora-geral da Novo Nordisk Portugal, Anja Salehar, explicou a importância de investir nos ensaios clínicos, uma área que foi bastante afetada em Portugal durante a fase mais preocupante da pandemia e como a Covid-19 enfatizou a necessidade de prevenir e tratar doenças como a diabetes e a obesidade, uma vez que são doenças prévias que apresentam fatores de risco de complicações em caso de infeção pelo novo coronavírus.

Na entrevista, a diretora-geral abordou ainda o movimento Cities Changing Diabetes, em conjunto com a Câmara Municipal de Lisboa, a Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP), a Administração Regional de Saúde de Lisboa e o Vale do Tejo (ARSLVT) e a Faculdade de Medicina da Universidade NOVA, que tem como objetivo promover atividades de sensibilização e prevenção da diabetes.

Que fatores de risco enfrenta uma pessoa com diabetes ou obesidade se for infetado com a Covid-19? De que forma a pandemia veio mostrar a urgência em tratar doenças como a diabetes e a obesidade?

As pessoas com diabetes e obesidade não têm maior risco de contrair Covid-19 do que qualquer outra pessoa. No entanto, sabe-se que as pessoas mais velhas e as pessoas com problemas de saúde subjacentes, entre as quais a diabetes e a obesidade, correm maior risco de sofrer complicações e ficar gravemente doentes em caso de infeção por Covid-19.

Segundo dados dos EUA, a diabetes é a segunda condição de saúde mais prevalente (9,7%) entre as pessoas infetadas pela Covid-19, logo após a hipertensão. 24% dos doentes internados e 32% dos doentes em cuidados intensivos também tinham diabetes. De acordo com um estudo na China, o índice de mortalidade observada em pessoas infetadas e com diabetes é de 7,3%, em comparação com o índice de mortalidade geral de 2,3%.

No caso da obesidade, estudos recentes  revelam que a obesidade está relacionada com um aumento significativo na morbilidade e mortalidade nas pessoas infetadas pelo novo coronavírus. Nos EUA, 48,3% dos doentes hospitalizados devido à infeção pelo novo coronavírus tinham obesidade. No Reino Unido, 39% dos doentes em estado crítico também viviam com obesidade.

Em Portugal, 13,6%, isto é, mais de 1 milhão de portugueses entre os 20 e os 79 anos tem diabetes, sendo que apenas pouco mais de metade deste número de pessoas estão diagnosticadas. Se olharmos para a obesidade, 62% da população portuguesa sofre de obesidade ou pré-obesidade, fatores que aumentam significativamente o risco de desenvolvimento de mais de 200 outras doenças crónicas, incluindo diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e alguns tipos de cancro, entre outras.

Estes números mostram-nos como é urgente prevenir e tratar o mais precocemente possível a diabetes e a obesidade, uma vez que são condições que afetam e comprometem o estado de saúde dos indivíduos de forma global.

De referir ainda que, nos últimos três meses (maio, junho e julho), registou-se uma redução de 53% no número de consultas nos cuidados de saúde primários e 21% nas primeiras consultas hospitalares, em relação ao mesmo período de 2019. Pelo que há muitos doentes com obesidade e diabetes que precisariam de acompanhamento médico e atualização da sua terapêutica que não têm ido às suas consultas, tanto pela redução da oferta de  consultas, como por medo de se deslocarem aos centros de saúde e hospitais, neste contexto de pandemia.

É muito importante garantir o restabelecimento das consultas em tempo útil, de forma a prestar um acompanhamento regular destes doentes. Caso contrário, assistiremos a uma maior taxa de complicações associadas ao não controlo das doenças crónicas.

Ainda há muito que não sabemos sobre este novo coronavírus, mas a evidência disponível sugere que um adequado controlo da diabetes, obesidade e comorbilidades comumente associadas a estas doenças, poderia resultar em menos casos graves e menor mortalidade por Covid-19.

Os portugueses apontam que têm faltado medicamentos para a diabetes nas farmácias. Que consequências esta falta de medicamentos pode ter para este grupo? 
A primeira preocupação desde o início da pandemia foi garantir o abastecimento contínuo dos medicamentos às pessoas que vivem com diabetes e outras doenças crónicas graves. Não tivemos qualquer constrangimento na produção e distribuição dos nossos medicamentos, incluindo insulina.

A Novo Nordisk está preparada para situações como a que vivemos, tendo uma política de stocks que assegura o fornecimento a longo prazo. Sabemos a importância crítica que isso tem para todos aqueles que dependem dos nossos medicamentos.

Foi nesse sentido que, durante a pandemia, aumentámos o abastecimento dos nossos produtos de forma a assegurar os stocks recomendados e garantimos a distribuição dos nossos medicamentos através de uma ampla rede de armazenistas e diretamente às farmácias, sempre que necessário.

Também trabalhamos em conjunto com as autoridades de saúde e com as associações e representantes das pessoas que vivem com diabetes, no sentido de promover uma gestão responsável do medicamento e desencorajando a aquisição de quantidades de embalagens em número elevado, não correspondendo a reais necessidades, o que levou em algumas situações a um desequilíbrio na normal disponibilização dos medicamentos.

Qual a importância de manter os ensaios clínicos a funcionar nesta fase? 
Derrotar a diabetes e outras doenças crónicas graves é um objetivo muito claro para nós, que só será alcançável com um enorme compromisso com a inovação, com a investigação e desenvolvimento,  da qual os ensaios clínicos são uma parte fundamental.

Os ensaios clínicos proporcionam um grande número de benefícios  para o desenvolvimento social e económico do nosso país.  Permitem o acesso a novas tecnologias em Saúde, a adoção das melhores práticas de acompanhamento dos doentes e a qualificação dos profissionais de saúde. Constitui ainda uma fonte de financiamento alternativa para as instituições, a criação de emprego e a atração de investimento para Portugal. Um estudo concluiu que cada euro investido na atividade de ensaios clínicos gera um retorno de 1,99 euros na economia portuguesa.

Nesta fase de pandemia que vivemos, é fundamental assegurar a continuidade do desenvolvimento clínico e encontrar respostas para as necessidades que persistem na área das doenças crónicas não transmissíveis, por forma a garantir que, no futuro, outras pandemias encontrarão as populações mais protegidas e saudáveis, reduzindo assim o seu potencial impacto.

Verificaram um grande aumento na procura da insulina?
Sendo a  insulina um medicamento essencial à vida de muitos doentes, é normal termos observado um aumento da procura na fase inicial do confinamento. Conforme referi, não tivemos qualquer constrangimento na produção e distribuição dos nossos medicamentos, incluindo insulina, mas é crítico salientar a necessidade de uma gestão responsável do medicamento, evitando aquisição de quantidades de embalagens em número elevado, não correspondendo a reais necessidades.

Que ensaios clínicos têm em funcionamento neste momento? 
Este ano, temos 18 ensaios clínicos a decorrer nas áreas da Diabetes, Obesidade, Hemofilia e Esteatose hepática não alcoólica (NASH). Comparativamente com 2018, mais do que triplicámos o número de doentes envolvidos nos nossos ensaios clínicos, o que reflete o nosso compromisso em investir no avanço científico nos centros de investigação portugueses, permitindo o acesso e experiência com tratamentos inovadores que estarão disponíveis em fases posteriores.

Como conseguiram manter a funcionar os ensaios clínicos que têm a decorrer durante a pandemia? 
A colaboração com os centros de investigação foi fundamental para conseguirmos dar continuidade aos 18 ensaios clínicos que temos a decorrer em Portugal. Em conjunto com os hospitais que acolhem os ensaios, foram delineadas as adaptações necessárias como, por exemplo, levar os medicamentos a casa dos mais de 300 doentes envolvidos, algo que antes da pandemia não era possível.

Quanto já investiram nos ensaios clínicos? 
Entre 2015 e 2020 a Novo Nordisk investiu mais de 2 milhões de euros em ensaios clínicos em Portugal.

Existe maior urgência em investir em ensaios clínicos? 
Em plena pandemia, os olhos da sociedade civil e dos governos estão postos na possibilidade de se encontrar uma vacina ou um tratamento para a Covid-19, e um considerável número de companhias farmacêuticas está  a trabalhar neste desafio.

Contudo, não nos podemos esquecer que as outras doenças não desapareceram, e que é igualmente urgente manter um elevado compromisso com o investimento na inovação clínica, para encontrar tratamentos eficazes e seguros que respondam às necessidades não atendidas destes doentes.

Qual o maior desafio da indústria farmacêutica no momento atual? 
Uma das lições mais claras desta pandemia de Covid-19 foi a importância da inovação clínica na resposta às ameaças globais de saúde, bem como aos desafios de saúde já existentes. Garantir que os doentes têm acesso mais rápido e equitativo a essa inovação médica é um desafio partilhado pela indústria farmacêutica, sistemas de saúde e governos.

Em Portugal, o tempo entre a aprovação dos medicamentos inovadores pela Agência Europeia do Medicamento (EMA)  e a sua efetiva disponibilização e comparticipação para que possam ser utilizados pelos doentes em Portugal é, em média, de 711 dias. Em Espanha, são 414 e na Dinamarca são 154.

Temos de ser capazes de resolver estas assimetrias e garantir que os portugueses têm acesso atempado aos melhores tratamentos.

Estamos a assistir a um novo paradigma da medicina com uma nova geração de tratamentos que traz implicações importantes sobre a forma como são geridos e financiados os sistemas de saúde.

Na área do medicamento, o sistemas de saúde estão muito focados nos custos e no impacto orçamental, os médicos não têm acesso atempado às melhores opções de tratamento, as empresas veem limitada a possibilidade de reinvestir a sua receita em mais inovação e, o mais importante, os doentes esperam mais do que o necessário por novos tratamentos que têm o poder de transformar as suas vidas. É fundamental quebrar este ciclo e encontrar novas soluções que respondam às necessidades dos doentes e profissionais de saúde, garantindo condições para a sustentabilidade dos sistemas de saúde e das empresas da indústria farmacêutica, permitindo-lhes continuar a investir em Investigação & Desenvolvimento.

Neste fase que vivemos, preocupa-nos o peso que a Covid-19 colocou sobre os sistemas de saúde e o impacto que isso possa trazer na gestão das doenças crónicas – é crítico garantir que os portugueses têm acesso à inovação terapêutica que demonstre ser eficaz, segura e custo efetiva.

O que é o projeto Cities Changing Diabetes? Qual o objetivo do projeto? 
“Cities Changing Diabetes” é uma plataforma global de colaboração desenvolvida em 2014 entre a University College London, o Steno Diabetes Center e a Novo Nordisk, em resposta ao aumento exponencial da diabetes nas cidades em todo o mundo.

A prevalência da diabetes tem aumentado a um nível alarmante, afetando mais de 400 milhões de pessoas em todo o mundo e um milhão de pessoas em Portugal. A doença tem um grande impacto na vida dos doentes, ao mesmo tempo que impõe uma pressão económica insustentável nos sistemas de saúde.

Duas em cada três pessoas que vivem com diabetes tipo 2 residem em cidades. A forma como as áreas urbanas são projetadas, construídas e administradas está a mudar a maneira como vivemos e, em alguns casos, a aumentar a nossa vulnerabilidade para a diabetes.

O programa Cities Changing Diabetes tem como objetivo dobrar a curva da diabetes, travando  a sua subida e até mesmo mudando a trajetória ao longo do tempo. O grande objetivo é conseguir que, em 2045,  esta doença não afete mais de 1 em cada 10 pessoas em todo o mundo.

Hoje, o programa conta com mais de 25 grandes cidades, entre elas Lisboa, que assinou em Novembro de 2019 a Declaração da Diabetes Urbana, subscrevendo os compromissos necessários para dobrar a curva do diabetes na cidade: foco na prevenção e bem-estar além do tratamento da doença; considerar as dinâmicas sociais e culturais que colocam as pessoas em maior risco; colaborar com as comunidades e parceiros e incluir a saúde em todas as decisões políticas.

O programa Cities Changing Diabetes Lisboa resulta de uma parceria entre a Câmara Municipal de Lisboa, a APDP – Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), a NOVA Medical School e a Novo Nordisk Portugal.

Fonte: O Jornal Económico

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